Contradizeções do idioma

Gramatica

Ontem uma moça se contradizeu, e jamais uma contradizeção fazeu com que tanta gente se disposse a discutir conjugação verbal.

Quem nunca falou “eu fazi” ou “eu dizo” quando tinha 5 anos de idade que atire a primeira gramática.

Falar bem um idioma não é dominar suas regras: é decorar as exceções. As anomalias. As idiossincrasias. As frescuras.

A primeira pessoa que disse “eu disse” é que devia ter sido corrigida por ser contradizetória. Pela lógica, a conjugação do verbo dizer era para ser

Eu dizo
Tu dizes
Ele dize
Nós dizemos
Vós dizeis
Eles dizem

Mas ai de quem maldizer a excepcionalidade desta conjugação.

Se deixássemos as crianças falarem de acordo com a sua inteligência, o português seria quase uma ciência exata.

Porque o cérebro adquire um conhecimento e passa a aplicá-lo, a fazer deduções lógicas. Isso funciona muito bem na matemática (uma regra de 3 funcionará da mesma maneira quaisquer que sejam os números envolvidos), na química, na física.

A língua é outro departamento.
Ela é de humanas.
E é aí que a porca torce o rabo.

Eu dizi
Tu dizeste
Ele dizeu

Eu me contradizi
Tu te contradizeste
Ele (ou ela) se contradizeu

Simples assim. Se o idioma sêsse cartesiano, claro.

Você dizerá que faltou revisão.
Eu dizo que faltou leitura.

É lendo que absorvemos essas particularidades, nos familiarizamos com elas.

Quem mal lê, mal ouve, mal fala, mal vê – já dizeu Monteiro Lobato.

A moça ainda se contradizerá muitas outras vezes.
Já quem escreveu a nota no jornal terá que fazer o dever de casa, e aprender com Monteiro Lobato: se eu mal leio, mal ouvo, mal falo, mal veio.

36 comentários em “Contradizeções do idioma

    1. Dizeu tudo! kkkkk Fez lembrar o diálogo que explica bem a lógica das crianças em relação às palavras:
      – Mãe, quero tintar!
      – Tintar?
      – Sim, com as tintas!
      – Ah, então você quer pintar, não tintar.
      – (…) É, quero pintar com muitas pintas coloridas!

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  1. Sou de humanas, senti pena de quem escreveu a nota.
    Contudo, gostei e vou roubar este argumento de exatas para quando reclamarem da namorada ciumenta: ” Porque o cérebro adquire um conhecimento e passa a aplicá -lo, fazer deduções lógicas.”

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  2. Delícia de texto, mormente (vixe!) por ser hoje o Dia da Língua Portuguesa. Numa manhã chuvosa (e fria para os padrões de Salvador), só tenho a agradecer. Obrigada!

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    1. Bom, como a profissão não exige diploma, qualquer um que assim queira pode se autoproclamar jornalista. Então, sim, foi uma “jornalista” de O Grobo.

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  3. Lembrei da minha irmã mais nova brigando com a mamãe quando ela disse que uma determinada palavra era com cê cedilha, e não com dois esses. Ela gritou: “TANTO FAZ!”

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  4. Quando eu dava aulas de Português para estrangeiros, um aluno do nível Iniciante disse: “Dezesseis, Dezessete, Dezeoito, Dezenove”. Achei o máximo em dedução lógica e seguimos adiante.

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